terça-feira, 20 de março de 2007

CORREIO BRAZILIENSE 20/03/2007

INVESTIGAÇÃO
Contratos sob suspeita da estatal que cuida dos aeroportos são os principais alvos de pefelistas e tucanos, que insistem na instalação da CPI do Apagão Aéreo
Fernanda Odilla e Ugo Braga
Da equipe do Correio

Pela primeira vez a oposição deixou claro que as investigações da CPI do Apagão Aéreo, se instalada, vão além dos atrasos nos aeroportos brasileiros. Na mira da CPI está a Infraero e seus contratos com empreiteiras, empresas terceirizadas e agências de publicidade.
De olho em contratos irregulares e em licitações suspeitas, o PFL já se mobiliza para apurar eventuais irregularidades na Infraero e desvendar o segredo do rombo de R$ 450 milhões, deixado em 2005. "Suspeitamos que o prejuízo da empresa esteja relacionado a um esquema entre quem licita e quem presta serviço", afirma o líder pefeleista na Câmara, Onyx Lorenzoni (RS).
Para justificar a ampliação do foco dos trabalhos da CPI, o principal argumento de líderes do PPS, PFL e PSDB é que o governo federal concentrou investimentos em obras nos aeroportos e deixou em segundo plano a compra de equipamentos e o treinamento dos controladores de vôo. "Os contratos estão dentro do campo da CPI. Não precisamos começar as investigações por este assunto, mas certamente ele pode cair no campo da CPI", afirmou, anunciando que servidores da Infraero sob suspeita terão que prestar esclarecimentos.

ACORDO FRUSTADO

Mas o primeiro passo da oposição para ver a CPI funcionando foi, ontem, tentar um acordo com a base. Um movimento que fracassou. O governo negou-se a fechar um acordo com a oposição quanto à criação da comissão na Câmara. Os líderes dos três partidos contrários ao Palácio do Planalto — Onix Lorenzonni, Antonio Carlos Pannunzio (PSDB-SP) e Fernando Coruja (PPS-SC) — propuseram abandonar a obstrução dos trabalhos, se os aliados se comprometessem a não votar na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) o recurso apresentado pelo PT contra a investigação. Seguros de que terão ampla maioria, os governistas nem precisaram de muito tempo para responder que preferiam partir para a batalha parlamentar.
A iniciativa do acordo partiu dos três oposicionistas. No início da tarde, eles foram ao gabinete do presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), e comunicaram a disposição de desobstruir os trabalhos na Casa. Chinaglia respondeu que deveria consultar o outro lado. E disparou telefonemas ao líder do governo, José Múcio Monteiro (PTB-PE), a seu vice-líder, Henrique Fontana (PT-RS) e ao líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN). Em volta da mesa de Chinaglia, Múcio disse que, se o governo tem maioria tanto na CCJ quanto no plenário, para onde o recurso irá depois, deve derrotar a oposição no voto.
Henrique Eduardo Alves, acompanhado do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que é uma espécie de controle remoto do presidente da CCJ, Leonardo Picciani (PMDB-RJ), garantiu que o partido votará em bloco com o Palácio do Planalto, como já havia feito na semana passada. A situação pareceu segura a todos. Tomada a decisão do "rolo compressor", os governistas vieram a público lustrá-la com a retórica do interesse no bem comum. "Nós chegamos a conclusão que a oposição está sem agenda e ficou interessada apenas em entrar em conflito com o governo", discursou Henrique Fontana, ao sair da sala de Chinaglia. Múcio foi na mesma direção: "A votação do recurso na CCJ é um processo que está perto do fim e, portanto, deve ser concluído. Cada um tem seu papel, oposição e governo. Politizar as decisões da CCJ poderia fazer com que a comissão perdesse seu sentido."
Entre os contratos da empresa já analisados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) chama a atenção o firmado com uma das duas agências vencedoras da Licitação 004/2004, para receber R$ 10,08 milhões e cuidar da imagem da Infraero.
Relatório do tribunal alerta para o fato de a empresa ter apresentado como atestado de capacidade técnica dois trabalhos feitos para petistas na Paraíba. Como se não bastasse, os clientes do mesmo partido do então presidente da Infraero, o atual deputado Carlos Wilson (PT-PE), a empresa ganhou 21 pontos no quesito Idéia Criativa na planilha individual de um dos avaliadores. Contudo, o máximo de pontos desse item era 20 e a empresa não atendeu a todos os atributos exigidos pelo edital, segundo relatório do TCU.

AINDA SEM RESPOSTA
O pedido de informação do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a CPI do Apagão Aéreo só chegou ontem na Câmara dos Deputados. Na semana passada , o ministro Celso de Mello disse que precisava de informações para se manifestar sobre o mandado de segurança ajuizado pela oposição, mobilizada para instalar da CPI. Enquanto a Presidência da Câmara não encaminha a resposta para a Justiça, oposição e base negociam acordo para suspender a obstrução que paralisou os trabalhos da Casa na semana passada.

Entenda o caso
Pendências na Justiça
O principal alvo da oposição, empenhada em instalar a CPI do Apagão Aéreo, é a Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero). O Correio revelou, na edição do último domingo, que integrantes do primeiro escalão da empresa, mesmo sob suspeita e sendo investigados em diferentes órgãos do Judiciário e do próprio Executivo, permanecem no cargo.
Pessoas de confiança da gestão Carlos Wilson, ex-presidente da Infraero e atual deputado federal pelo PT de Pernambuco, mantêm-se em cargos de chefia e gerência enquanto a empresa coleciona pendências junto à Controladoria Geral da União (CGU), Tribunal de Contas da União (TCU) e na Justiça. Além das suspeitas de obras superfaturadas, irregularidades em contratos de publicidade e licitações dirigidas, a oposição está de olho também no caixa da Infraero.
Durante a gestão de Carlos Wilson a Infraero teve déficit de R$ 450 milhões. No início de 2005, antes de a empresa fechar no vermelho, presidente Lula chegou a chamar a atenção do ex-chefe da estatal para manter o equilíbrio nas contas. Carlos Wilson disse que sua meta não era dar lucro, mas garantir serviços de qualidade e segurança aos usuários. Ele é categórico em dizer que, se não fossem as obras e reformas tocadas por ele, o caos do ano passado seria maior.

ESTADÃO 20/03
TCU acusa infraero por licitações e gastos ilegais
Infraero é acusada de pagar serviços não concluídos
3 em cada 10 vôos atrasam e há esperas de até 12 horas no 2.º dia do Apagão
Pista principal de Congonhas pode ficar para novembro
SP é destaque em ranking mundial

Expedito Filho, BRASÍLIA

Direcionamento de licitação, contratos turbinados com aditivos sucessivos de 25% e pagamento de serviços não concluídos são as principais irregularidades praticadas pela Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero), de acordo com quatro relatórios preliminares do Tribunal de Contas da União (TCU) obtidos pelo Estado. As denúncias vêm à tona em meio a mais uma crise no setor aéreo.
Os relatórios são de 2005 e abordam denúncias encaminhadas ao tribunal apontando ilegalidades em obras realizadas em pelo menos oito aeroportos, entre eles os principais de São Paulo: Congonhas, Guarulhos e Viracopos. As acusações foram avaliadas pelos técnicos da Secretaria de Controle Externo (Secex), repartição ligada ao TCU e encarregada de vistorias.
Num dos relatórios, os técnicos da Secex recomendam por escrito: "Tendo em vista terem sido encontrados indícios de irregularidades nas obras de Viracopos, Guarulhos e Macapá (...) entendemos que deve ser proposto à Secretaria Adjunta de Fiscalização que verifique a conveniência/oportunidade de incluir nos próximos planos de fiscalização (...) auditoria nas obras realizadas nos aeroportos de Congonhas, Campo Grande e Corumbá."
Todas as denúncias estão sendo apuradas, em caráter sigiloso, sob o comando do ministro do TCU Lincoln Magalhães da Rocha, encarregado de relatar o processo. O tribunal informa ter recebido denúncias anônimas por via eletrônica e considerado fundamental a apuração delas depois que alguns indícios de irregularidades foram confirmados. Um dos casos que mais chamaram a atenção dos técnicos foi o pagamento de R$ 8 milhões por obras em Congonhas e Viracopos antes mesmo da conclusão dos trabalhos.
Apesar de todos os problemas nos aeroportos, a Infraero não se furtou a direcionar R$ 150 mil para a Conferência Nacional Terra e Água, promovida pelo Movimento dos Sem-Terra (MST) em 2004. Com um detalhe que impressionou os técnicos: o pagamento do patrocínio ocorreu dois meses após o evento, mas o recibo, emitido pela Cáritas Brasileira, é anterior à quitação da dívida.
Em sua defesa nesse caso, a Infraero afirma não ter contrariado a lei. O objetivo do encontro era debater a distribuição de recursos agrários e a conferência não foi formulada para se posicionar contra o governo. Nesse contexto, a erradicação da pobreza e a reforma agrária seriam promessas constitucionais de interesse de todos, e também da Infraero.
Na denúncia encaminhada ao TCU, afirma-se que, em alguns casos, as obras são realizadas com "material inadequado", o que acaba não sendo registrado graças ao suborno de fiscais, e que os responsáveis pelas empreiteiras mantêm "relação promíscua" com diretores da Infraero.
Sempre segundo os relatórios preliminares, a empresa Serveng Civilsan S.A, participante do consórcio contratado para as obras de Cumbica, "encontrava-se inabilitada à época da licitação, com débito não suspenso inscrito na dívida ativa da União desde 21 de maio de 1992". O TCU constatou outro débito da empresa, de 30 de junho de 2004. Os dois processos encontram-se na situação ativa ajuizada, o que, segundo o TCU, impede a empresa de prestar serviço a órgãos públicos.
Também chegaram ao TCU denúncias de que a Planoway e a Planorcon são sempre as companhias subcontratas pelas empresas que ganham licitações da Infraero. Diante disso, o TCU proibiu uso de artifícios técnicos para beneficiar a contratação de serviços de determinadas empresas. Recomendou que a Infraero evite incluir exigências que comprometam, restrinjam ou frustrem o caráter competitivo das licitações. Para o líder do PFL, Onyx Lorenzoni (RS), as denúncias demonstram a necessidade de instalação de CPI e de investigação pelo Ministério Público. O PFL ingressa hoje com queixa-crime contra a Infraero.

ESTADÃO
2º dia do Apagão: atraso em 30% dos vôos e nenhuma certeza de solução
Presidente da Infraero admite uma situação "muito ruim": "Não tenho coragem de dizer: ‘acabou hoje’"

Bruno Tavares e Tânia Monteiro

BRASÍLIA - Os efeitos do apagão aéreo ocorrido na manhã de domingo se estenderam por todo o dia de ontem, provocando efeito cascata nos principais aeroportos do País. De acordo com boletim da Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero), houve atrasos em 30,5% dos vôos - ao todo, foram afetados 455 dos 1.510 pousos e decolagens programados para ocorrer entre zero e 20 horas. O Aeroporto de Congonhas foi um dos mais prejudicados. Entre 12 e 14 horas, quase 50% dos vôos estavam atrasados.
O presidente da Infraero, brigadeiro José Carlos Pereira, disse ontem que a situação nos aeroportos só deverá ser regularizada no início da noite de hoje. "Fizemos previsões para 11 horas, depois 13 horas (de ontem), mas logo alteramos pela gravidade do caso." Ele ressaltou que o cenário ainda era "muito ruim" e não se arriscou a dar um prognóstico sobre o fim da crise. "Não tenho coragem de dizer: ‘acabou hoje’. Não tenho controle sobre toda a situação."
Irritado com o novo caos nos aeroportos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva convocou uma reunião de emergência com todas as autoridades responsáveis pela aviação civil. Em nota oficial, o Ministério da Defesa - pasta à qual está subordinado o Comando da Aeronáutica - atribuiu os problemas à pane no sistema informatizado de processamento de planos de vôo do centro de controle aéreo de Brasília (Cindacta-1) à queda de energia no Aeroporto Juscelino Kubitschek, também na capital federal, e às chuvas que levaram ao fechamento da pista de Congonhas.

BACKUP
Lula determinou que os usuários recebam informações de modo rápido e correto nos aeroportos e que sejam implementados equipamentos reservas eficientes e eficazes. Essa é a segunda vez em pouco mais de três meses que aparelhos do Cindacta-1, o principal do País, apresentam panes incomuns. Em dezembro, o sistema de rádio deixou de funcionar, o que provocou o cancelamento de dezenas de vôos. Na ocasião, a Aeronáutica admitiu a falta de um servidor reserva.
Desta vez, o backup existia. Entretanto, o equipamento reserva roda o mesmo software do principal. "Se o problema tiver mesmo sido no software, o que aparentemente ocorreu, era preciso não só ter um aparelho reserva, mas também um software reserva, com configurações independentes da rede principal", explica o engenheiro de uma empresa que presta serviços à Aeronáutica. O custo desse sistema mais sofisticado é duas vezes maior que o convencional - avaliado em R$ 10 milhões para um centro de controle do porte de Brasília.
Desde a tarde de domingo, uma equipe de técnicos do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea), do Rio, está em Brasília checando o hardware e o software do sistema. "Estamos fazendo investigação dos diversos inputs que o sistema de tratamento de vôo possui", disse um oficial, assegurando que o sistema existente é totalmente duplicado e funciona sempre com um reserva. Segundo ele, os técnicos estão recolhendo todas as mensagens repassadas ao sistema 1 para saber qual foi a que fez o equipamento travar e impediu que o servidor 2, o reserva, entrasse em funcionamento imediato.
A Aeronáutica assegurou que foi concluída em 2006 a revitalização do sistema do Cindacta-1 com o X 4000, a versão nova de software do sistema de controle de área que existe no País, e, agora, a mesma substituição começa a ser feita em Curitiba. Com isso, a FAB tenta derrubar as denúncias feitas por controladores de que o sistema está ultrapassado e apresenta esse tipo de pane com freqüência.

Nenhum comentário: