São Paulo, quarta-feira, 28 de março de 2007
Prática entre novos e ex-deputados, já em curso no Congresso, é vetada por Walfrido, coordenador político do governo.
Oposição vê tática para inflar base de Lula; líder da minoria, Júlio Redecker (PSDB-RS), diz sentir "cheiro de mensalão" na Câmara.
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Líderes de partidos aliados do governo no Congresso vêm tentando oficializar uma prática -já em curso nos bastidores- de dividir a paternidade de emendas provenientes de recursos do Orçamento da União entre parlamentares que não conseguiram se reeleger e os novatos. A estratégia está sendo articulada há um mês por partidos da base aliada.
Há um mês, por exemplo, o líder do PR, Luciano Castro (RR), fez ao então coordenador político do governo, Tarso Genro (hoje ministro da Justiça), a seguinte proposta: que as emendas de deputados antigos fossem simplesmente "doadas" aos novos. Tarso informou, por meio de sua assessoria, que não se lembra desta conversa.
Cada deputado eleito tem direito a apresentar em torno de R$ 6 milhões por ano em emendas direcionadas à execução de obras em suas bases eleitorais.
A liberação é lenta e muitas vezes depende da vontade política do ministério. Quando um deputado não consegue se reeleger, o pagamento das emendas pendentes fica mais difícil.
Segundo revelou ontem o "Painel", a proposta em gestação entre as siglas aliadas é que o deputado novo "administre" até R$ 3 milhões em emendas, ou seja, pressione nos respectivos ministérios para que determinada obra saia do papel. Nos corredores do Congresso, o assunto é tratado como "apadrinhar" uma emenda.
"O eleito pilota a emenda politicamente, e o não-reeleito também recebe os louros", resumiu o líder do PTB, Jovair Arantes (GO).
Ontem, essa idéia foi levada pelo líder do governo na Casa, José Múcio (PTB-PE), ao novo coordenador político, ministro Walfrido dos Mares Guia (Relações Institucionais), que não autorizou a prática.
"Não sei quem inventou, mas isso não existe, não pode. Vamos buscar outros caminhos", disse o ministro. Segundo Múcio, "se a Casa renovou 46%, significa que 46% das emendas apresentadas [em 2006] estão sem pai nem mãe".
Para a oposição, a prática é uma das táticas do governo para inflar as bancadas aliadas, atraindo deputados novatos para a base com a oferta de serem contemplados já no início do mandato com recursos de emendas em fase de liberação nos ministérios. "O cheiro do mensalão continua nesta Casa", afirmou o líder da minoria, Júlio Redecker (PSDB-RS). Apesar do veto de Walfrido, a Folha apurou que a prática já está em curso. O ex-líder do PMDB José Borba (PR), que renunciou na esteira do escândalo do mensalão e não se reelegeu, citou deputados para os quais "doou" suas emendas, entre eles o novo ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes (PMDB-PR). "Compartilhamos tudo, fazemos uma política de boa vizinhança", disse, afirmando que, no final, ambos levam o crédito pela obra.
Stephanes negou se tratar de acordo político: "O que pode ter acontecido é ele ter apresentado emendas para determinado município onde sou bem votado e o prefeito ter pedido para um assessor meu: "Olhe, vê aquela emenda para mim'".
O ex-líder do PMDB também citou os paranaenses Ricardo Barros (PP) e Luiz Carlos Hauly (PSDB) como herdeiros de suas emendas. Eles negam.
(SILVIO NAVARRO, LETÍCIA SANDER E RANIER BRAGON)
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