sábado, 31 de março de 2007

Após motim, governo cede, faz acordo e controladores de vôo encerram a greve

Operadores conseguem a abertura de negociação sobre reajuste e desmilitarização e promessa de que não haverá punições
Protesto provocou filas e irritação nos aeroportos; no Rio, um passageiro chegou a dar um soco no olho de uma funcionária da BRA
LEILA SUWWANDA
SUCURSAL DE BRASÍLIA
Os controladores de vôo se amotinaram ontem, paralisando o espaço aéreo brasileiro e obrigando o governo federal a ceder a suas exigências por escrito para voltar ao trabalho.
O motim, iniciado no Cindacta-1, em Brasília, durou cinco horas e 20 minutos, espalhando-se pelo país e suspendendo praticamente todas as decolagens no país.
Pego de surpresa, o governo formou um gabinete de crise e se reuniu por telefone com o presidente Lula -que estava em vôo para Washington e vetou decisão da Aeronáutica de prender os sargentos amotinados. O presidente interino, José Alencar, foi chamado de Minas Gerais para coordenar a crise em Brasília.
O ministro Paulo Bernardo (Planejamento) e a secretária-executiva da Casa Civil, Erenice Guerra, foram negociar pessoalmente com os controladores no Cindacta-1 às 22h30.
Uma hora e meia depois, os dois assinaram um compromisso no qual o governo promete rever punições já aplicadas e não realizar retaliações pelo motim de ontem. Além disso se comprometem a retomar na terça-feira, 3 de abril, duas negociações: a de uma "solução civil" para o setor e a gratificação salarial.
"Ele [Lula] determinou o seguinte: "Nós estamos com um gravíssimo problema que afeta a segurança nacional. O essencial é voltar à normalidade". Para tanto, abrimos uma negociação", disse o ministro Franklin Martins (Comunicação Social), confirmando o acordo.
E reduziu os efeitos da exclusão do brigadeiro Juniti Saito, comandante da Aeronáutica, das negociações -exigência dos próprios controladores.
"Ele não foi desautorizado", disse Martins.
As decolagens seriam retomadas na madrugada, gradualmente, e são esperados muitos atrasos neste fim de semana, até a normalização do fluxo.

Motim

O motim praticamente congelou o espaço aéreo brasileiro. Em São Paulo, por exemplo, entre 18h55 e 0h30, houve 108 cancelamentos (entre pousos e decolagens) e só 19 decolagens (para o Sul e Rio).
Houve confusão em vários aeroportos -no Rio uma funcionária da BRA chegou a ser agredida com um soco.
Em decorrência do fechamento do espaço aéreo, várias companhias internacionais cancelaram vôos para o Brasil e até mesmo para a Argentina (já que teriam de passar pelo espaço aéreo brasileiro).
De um modo geral, apenas os aviões que já estavam em rota eram controlados até seu destino final. Novas decolagens só eram autorizadas para emergências (transporte de órgãos, doentes, ambulâncias aéreas) ou missões (vôos de autoridades ou de operações militares).
Os controladores se recusaram a falar com oficiais militares e vetaram o até então aliado Waldir Pires (Defesa).
O estopim do protesto foi a transferência do sargento Edleuzo Cavalcanti do Cindacta-1 para um pequeno destacamento em Santa Maria (Rio Grande do Sul) -havia temor de mais transferências ou prisões. Ele é diretor de mobilização da Associação Brasileira de Controladores de Tráfego Aéreo e foi um dos alvos do Inquérito Policial Militar que apurou a operação-padrão de 2006.
A data coincide com os seis meses do acidente do vôo 1907 da Gol, que deflagrou a crise.
O país tem cerca de 2.300 controladores civis e militares vinculados à Aeronáutica e que atuam em torres de aeroporto, área de aproximação e controle de área (as três divisões do tráfego), além da Defesa Aérea. Cerca de 80% do total é militar e são proibidos pela Constituição de realizar greve. O protesto começou durante o dia como aquartelamento voluntário e greve de fome e a paralisação começou de fato às 18h40 no Cindacta-1 em Brasília, centro responsável pelo Centro-Oeste e Sudeste, ou quase 75% do tráfego aéreo nacional.
Apenas esse centro parado engessa o tráfego nacional. O Cindacta-4, em Manaus, aderiu depois e, em seguida, o Cindacta-2 (Curitiba) se uniu ao motim. O status do Cindacta-3 (Recife) permanecia incerto.
Em Brasília, mais de 200 sargentos estavam amotinados dentro e nos cômodos em volta da sala de controle principal.
Antes de iniciar as negociações com Paulo Bernardo, houve dois momentos de tensão. Primeiro, Saito sugeriu dar voz de prisão aos amotinados, e a notícia se espalhou. Lula vetou, falando do avião presidencial.
Em outro momento, a FAB tentou resolver a questão internamente. O chefe do Cindacta-1, coronel Carlos Vuyk de Aquino, chamou um grupo de 16 controladores mais antigos para conversar. Porém o grupo rejeitou a iniciativa.
O protesto começou no início do dia, com a circulação de um manifesto anunciando a intenção de aquartelamento voluntário e uma greve de fome. Quatro reivindicações foram listadas: fim das retaliações, gratificação salarial, desmilitarização do setor e a participação de controladores numa comissão para acompanhar o processo.

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